Por que o Estado-nação tem perdido poder?

24/10/2013 - Thiago Bittencourt

Este mapa representa todos os aeroportos conhecidos no mundo. O processo de globalização foi beneficiado pelos aprimoramentos nos meios de transporte, e, atualmente, é uma ameaça ao Estado-nação. (Créditos: Open Flights)

O processo de globalização, como descrito pelo geógrafo brasileiro Milton Santos, é caracterizado por três aspectos diferentes: “fábula, perversidade e possibilidade”. O primeiro alega que os países integrar-se-ão mais, logo suas sociedades e economias prosperarão. De acordo com o segundo, essa prosperidade é prejudicada, pois se intensificam as desigualdades sociais, degrada-se o meio ambiente, e a mecanização transforma o mercado de trabalho. O terceiro cenário, entretanto, é mais otimista, uma vez que reafirma o potencial para a construção de um mundo melhor – não idealizado, porém suficientemente bom. Entre as consequências da “globalização perversa”, está a perda de poder dos Estados-nação, um fenômeno contemporâneo.

Um dos princípios da integração global é a padronização de ações governamentais. A União Europeia, por exemplo, só conseguiu consolidar suas alianças quando determinou regulamentações comuns a todos os seus membros. Essas leis amplamente adotadas, como as políticas ambientais supranacionais, consistem em uma série de limitações à autonomia nacional. A soberania dos Estados-nação é ameaçada pela crescente necessidade de estabelecimento de parcerias com outros países da arena global. Isso é explicado pelo fato de que tais estados são forçados a aceitar as normas internacionais, para que eles tenham relações mais profundas com seus vizinhos. A supremacia de cada país, portanto, é enfraquecida, devido a pressões diplomáticas.

Outra restrição à autoridade dos governos é provocada pela diferença de poder entre eles e as multinacionais. Inúmeras corporações têm desafiado o Estado-nação, por conta da força econômica que elas ostentam. Utilizando-se do poderio financeiro, essas empresas tentam convencer diversas instituições políticas a aprovar projetos de leis que favoreçam o comércio – assim, qualquer tentativa de regulação excessiva do capitalismo torna-se um repulsor de investimentos externos. Consequentemente, essa questão é predominante em países não desenvolvidos, os quais não têm opção senão aderir às demandas coercitivas, para evitar que a ajuda monetária da comunidade internacional seja interrompida. Nações industrializadas, todavia, simplesmente param de exercer práticas regulatórias: é de interesse delas o estímulo à industrialização e aos negócios. Dessa forma, percebe-se que a iniciativa privada pode representar uma ameaça ao Estado.

Além disso, o Estado-nação não pode divergir dos interesses de sua própria população – especialmente em tempos nos quais o “soft power” (a capacidade de uma nação influenciar outras por meio de recursos imateriais) é exposto pela cultura. Como a “aldeia global” promove a convergência de várias tradições previamente locais, ela pode causar mudanças no modo de uma sociedade pensar. Com isso, cada governo é obrigado a adaptar-se de forma a refletir as novas características do eleitorado. O problema, entretanto, é que essas transformações não são produtos normais da interação social. Na verdade, elas representam mais um tipo de influência que apoia ideais universais, em detrimento dos nacionais. Assim, cada Estado perde suas particularidades, na medida em que a integração acarreta a homogeneização da sociedade civil.

O Estado-nação está perdendo seu poder, sua influência e sua independência no atual mundo globalizado. Isso se resulta de desafios diplomáticos, conflitos com multinacionais e do advento de uma “aldeia global” que unifica culturas sob a bandeira da cidadania cosmopolita. Por outro lado, esse enfraquecimento da soberania estatal não é absoluto. O capitalismo estatal, por exemplo, aparenta ser uma maneira de garantir que cada governo manterá, ao menos, parte de sua autonomia. Adicionalmente, é de responsabilidade estatal a coordenação do processo de integração, devido às capacidades governamentais de decisão nas organizações internacionais. Portanto, pode-se inferir que, embora o Estado-nação não seja tão poderoso quanto foi no início da globalização, ele ainda é pilar fundamental para a continuação do progresso.